Tomarei como eixo principal deste artigo a busca pela
inovação comercial relevante em
produtos e serviços. Em outras palavras, algo percebido como novo e importante
pelo mercado. O adjetivo útil também não pode faltar. Muito se tem refletido
sobre conceitos e metodologias, e cases de sucesso e fracasso são
constantemente apresentados. A bibliografia é extensa. A magnitude e a
pertinência do tema sugerem uma espécie de Santo Graal do business (perdoem-me o
exagero na analogia).
O grande desafio, em resumo, é entender e decifrar as necessidades ocultas dos potenciais
consumidores. Nossa dificuldade é uma característica inerente aos seres
humanos: a incapacidade de expressar com clareza o que precisam ou desejam.
Isso quando reconhecem (tem consciência) que precisam ou desejam algo. As
ferramentas convencionais de pesquisas de mercado pouco contribuem nesse
processo. Steve Jobs, portanto, tinha razão (mais uma vez).
Ciente da contenda, minha proposta aqui é eleger uma área coordenadora dos esforços para
revelações constantes de insights de negócios. Penso que Inteligência de
Mercado – ou sua correlata na organização – poderia cumprir bem esse ofício.
Mas antes, é prudente que separemos o portfólio de IM em ferramentas convencionais
e não-convencionais. Assim, compreenderemos melhor, inclusive, o significado da
palavra coordenação neste contexto.
Sem maiores delongas (não é o nosso foco), as ferramentas
convencionais de Inteligência de Mercado procuram cobrir, basicamente, três
pilares: mercado, clientes e concorrência.
Diversos propósitos e metodologias derivam desta compreensão. Podemos lembrar alguns
deles aqui como as auditorias de performance da marca, as pesquisas de
satisfação e lealdade, os estudos de perfis de concorrentes, os mapeamentos de
mercado, as análises de percepção dos clientes/consumidores (checagem do
branding), o uso do CRM como base para ações táticas, tratamento de leads e
retenção de clientes, as consultas dinâmicas de fontes externas jornalísticas
(clipping), entre outras inúmeras possibilidades.
Em síntese, são todos reconhecidamente importantes e necessários para o monitoramento adequado dos diversos fatores que compõe o cenário mercadológico em que a marca atua. Alguns movimentos inclusive podem ser previstos com certa razoabilidade e até insights interessantes podem ser extraídos deles. Mas então, qual é a grande limitação que se impõe em nossa nobre ambição na caçada por inovações comerciais relevantes (e constantes)?
As ferramentas convencionais de Inteligência de Mercado são,
em essência, de natureza histórica. Pouco podem fazer para desvendar e traduzir a mente dos consumidores (suas necessidades
ocultas e não-expressas, lembram?). Suas estruturas, em linhas gerais,
sistemáticas e fundamentas em fatos concretos dificultam viajar em terrenos
desconhecidos, virtualmente significativos no campo da inovação. Nossa fuga,
assim, seria para as pesquisas de mercado inovadoras (ou não-convencionais). Aquelas
de natureza mais abstrata, espontânea e aberta.
Pesquisas de mercado inovadoras. Talvez não seja esta a
melhor nomenclatura. Mas seguiremos em frente na falta de um termo mais
original. O importante é organizar de alguma forma (e sem a obrigatoriedade de
se “amarrar” a receitas prontas), um processo permanente de fluxo de ideias e
sugestões no qual a participação de todos os stakeholders é condição sine qua non para o sucesso
nesse campo. Aqui fecha, portanto, a defesa da tese de um trabalho habilidosamente
coordenado a partir de uma área, teoricamente, com visão mais abrangente do
mercado.
Obviamente, a composição de uma doutrina como esta requer investimentos e apoio por parte da
cúpula da empresa. Questões mais operacionais, porém igualmente
necessárias, como a definição do sistema de informações e fluxo de comunicação,
a metodologia de avaliação e classificação das ideias, a política de
incentivos, o cruzamento com outras fontes de pesquisa, a estruturação didática
para a capacitação e treinamento das equipes (em especial, a área de vendas), os
recursos necessários, as metas propostas, os procedimentos de monitoramento, acompanhamento
dos projetos, etc., constituem parte essencial para o sucesso da missão. Assim,
Inteligência de Mercado tem a oportunidade de liderar o novo.
Cases de sucesso não faltam. Não necessariamente liderados pela área de Inteligência de Mercado, mas o conceito em si já foi há muito tempo compreendido por empresas como a 3M (ou algum consumidor disse claramente à empresa que precisava de um papelzinho colante para anotar pequenos recados ou de um par de protetores auriculares para diminuir ruídos e assim dormir melhor?), a Apple (ou algum consumidor disse claramente à Steve Jobs que precisava de um aparelho do tamanho de um caderno e com basicamente as mesmas funcionalidades do Iphone e do Mac Pro?), a Netflix (ou algum consumidor disse claramente à empresa que precisava de um portal na internet para acesso direto à diversos filmes e seriados por meio de uma pequena taxa mensal?), a Southwest Airlines (ou algum consumidor disse claramente à empresa que precisava de mais roteiros regionais de negócios e não ligava muito para todo o aparato oferecido pelas grandes companhias aéreas?), a Curves (ou alguma consumidora disse claramente à Gary Heavin que precisava de uma academia só para mulheres?) e o Linkedin (ou algum executivo disse claramente à Reid Hoffman que precisava de uma rede social só para contatos profissionais, desenvolvimento de networking e busca por empregos?).
E existem muitos outros exemplos de sucesso por aí para reforçar
que, muitas vezes, apenas uma participação mais ativa e democrática dos
stakeholders da marca, uma maior proximidade com os clientes/consumidores e um olhar
aguçado sobre as suas reais necessidades e desejos são mais produtivos dos que
as chamadas pesquisas convencionais. Pelo menos, quando se trata de inovações
comerciais relevantes, elas não captam as nuances
de que tanto precisamos.
Sensato salientar ainda que qualquer novo produto ou
serviço, proveniente de um processo de inovação aberta e sob eventual liderança
de Inteligência de Mercado, deve estar alinhado à essência da marca, ou seja, a
sua missão, visão e valores. Não se deve tolerar inovação por inovação. A marca
deve ter alguns princípios que precisam ser respeitados. E o tradicional
Marketing, ansioso por entrar em campo, também terá a oportunidade de utilizar
todo o seu vasto portfólio de comunicação e promoção para fortalecer os
benefícios de um processo de inovação mercadológica em sintonia com os
verdadeiros e autênticos anseios dos consumidores. Mas aí já é outra história.
ah...o título: inspirado em David Foster Wallace, falecido
escritor norte-americano. Antes de tudo, um grande inovador...